segunda-feira, 18 de abril de 2011

Cemitério da mente

                                
    
Quantas vezes morre-se em uma vida? Mesmo que aparentemente paradoxal digo que principalmente três. Durante a vida mudamos de opinião, pensamento, jeito de ser diversas vezes. Não somos os mesmo de quando criança, não somos os mesmos de quando adolescente e não seremos os mesmos na velhice. É algo inerente a vida: mudar, nada é estático, na vida humana tudo é dinâmico, por isso que se chama vida.
            A infância é uma das fases mais peculiares a meu ver, temos infinitos amigos metafísicos, eles existem de fato. Somos capitães, generais, médicos, caça fantasmas, bombeiros, agentes secretos, policiais, bailarinas, cantores, jogadores, juízes... Somos crianças. Temos uma inocência inerente a essa fase: a aurora da vida. A vida é altamente lúdica, tudo é brinquedo tudo é brincadeira não temos preocupação alguma, a não ser de encontrar um brinquedo perdido ou correr do escuro, coisas de crianças. Temos muitos medos nessa fase, mas temos um refúgio: nossos pais. É nessa fase que andamos pela primeira vez de bicicleta, que descobrimos que cair dói, nessa fase uma arvore não é uma arvore é tudo menos uma arvore. Nada é o que os homens grandes dizem que é. Nessa fase tudo é como queremos que seja nós somos o pequeno príncipe que vive a explorar outros mundos e o nosso próprio também.
            A maioria de nós quando alcançamos a adolescência procuramos nos distancia da nossa infância, passamos a considerá-la uma fase de larva. O lúdico torna-se para nós algo não tão somente pueril como patético, é o primeiro sinal que estamos deixando de ser pequenos príncipes para nos tornar homens grandes. Nossos amigos metafísicos, aqueles que ninguém via, mas eles existiam são trocados por uns empíricos, bem empíricos! Passamos a ter umas visões interessantes: nossos pais outrora incríveis, agora são os chatos, são inquisidores, querem colocar grilhões em nós, querem acabar com nossa vida. Nossos antigos medos agora se tornam irreais e pueris, ninguém mais tem medo do escuro, mas morre de medo que uma enorme espinha nasça no rosto um dia antes de um encontro. Nossos desejos mudam como mudam. Enfim mudamos, entramos em uma nova fase, o mais interessante é a forma romântica do adolescente ver o mundo, temos uns Alvores de Azevedo espalhados por ai que vêem com um pessimismo incrível, tudo vai de mal a pior, morre por um amor não correspondido; temos também uns Camilo de Castelo Branco que levaram ate as ultimas conseqüências o seu amor; temos uns Castro Aves que se revoltam com o mundo injusto querem libertá-lo da escravidão. Tudo isso é comum, não é a toa que os escritores citados começaram a escrever na adolescência. Fase esta que por menos que dure nunca a esquecemos, pois alguns acontecimentos significativos ocorrem nessa fase se por sua vez na infância andamos pela primeira vez de bicicleta agora damos o primeiro beijo.
            Depois da adolescência costumamos a tornamos um pouco mais maduros, pelo menos em tese. Não choramos mais um rio de lagrimas por um coração partido ou por algo que agora consideramos banal, o mundo já não é tão romântico como antes. Nem tudo são flores, mas também não vivemos no inferno. Talvez nós passássemos a nos acostumar com o mundo, aprendemos a conviver nele. Agora não temos mais aquela inocência de criança ou a leviandade da adolescência, não temos tempo para isso agora temos um relatório para entregar em dois dias. De fato crescemos não somos mais um pequeno príncipe, mas ainda temos nosso mundinho no qual vivemos. A fase de revolução já passou, ficou lá atrás na adolescência. Não queremos mudar o mundo temos outros planos: enriquecer, constituir uma família e sermos o que nunca queríamos nos anos de adolescência. Alguns se revoltam com Deus, apelidando-o de Fator deus, alguns de nós acabamos por ter uma visão meio Saramago, confiamos em nossas próprias forças, afinal somos os selecionados. Deus? Bem ele se transforma em algo morto, acaba por ficar junto com nossos amigos metafísicos, pelo menos parte de nós pensa assim, parte acredita que deus só existe no cérebro humano. Outros querem ter uma vida regrada, apoiada em uma religião. Mas a maioria vive seus dias arrastando-os,  uma monotonia sem fim. Nas ferias viajamos para quebrar esse ciclo vicioso, mas é apenas por um mês. Nessa fase da vida percebemos que nossos pais não eram tão cruéis assim, nós que éramos os vilões da historia.

            Finalmente chegamos ao crepuscular, à velhice. Uma fase de reflexão para uns, para outros apenas serve para reclamar da vida, das pessoas e do mundo. Uma fase interessante como todas as outras, mas com um acréscimo experiência. Não temos mais aquele corpinho de 30 anos, nosso cabelo está grisalho e temos mais rugas que a quantidade de estrelas no céu. Geralmente há dois caminhos a se seguir: ou ficamos felizes por ter vivido ou passamos nossos últimos dias reclamando de tudo -muitos escolhem essa ultima opção-. Podemos recordar da vida a qual teve altos e baixos, erros e acertos, ou podemos reclamar das costas que não param de doer. Lembrar dos dias de aurora não os trarão de volta, reclamar da dor não a fará passar. O que fazer?  Quando tiveres a respostas terás dado um enorme salto. O lado bom da velhice é que sabemos que não somos mais eternos.
            Essas são as três principais mortes, mas existem as secundarias. Quantos de nós já não mudamos de idéia sobre algo? Constantemente mudamos de opinião, isso é dialética! Temos uma tese que se confronta com uma antítese alguma terá que prevalecer, resultado? Temos a síntese. Somos dinâmicos -caso contrario seriamos uma pedra!-, aprendemos mais e mais a cada dia. Todo o dia morremos -ou pelo menos parte de nós-. A pergunta é o que acontece com esses cadáveres? Vão para o cemitério, o cemitério da mente. Vez ou outra os visitamos, alguns sentimos vontade de ressuscitar, outros de enterrar mais fundo. No fim da vida temos um cemitério bem grande, com idéias incríveis, outras estúpidas, outras pueris. Quando morremos e vamos para nosso sepulcro, conosco vai uma vida de dialética um cemitério de dimensões incríveis. Uns é claro desenvolvem um cemitério maior do que outros.
            Durante a vida um bom local para se visitar é o cemitério da mente as placas cinzas são boas para lembrar de quem fomos e somos. Ao lermos podemos ri "aqui jaz o medo de fantasmas" ou ver que podíamos acreditar "aqui jaz o anseio por um mundo melhor" infelizmente alguns possuem uma lapide "aqui jaz a esperança da Vida, aqui jaz meu criador". Cada um durante sua vida, decide acreditar no que deseja, somos livres para enterramos o que acharmos melhor. Claro que tudo possui suas conseqüências.

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