terça-feira, 8 de novembro de 2011

A máscara


       
           Na primeira vez que coloquei esta máscara jamais imaginei que não conseguiria tirá-la. Jamais pensei que deixaria de ser um Houyhnhm para me tornar um Yahoo. Jamais presumi que o meu Eu seria substituído pela máscara que vestia. Uma imagem! Tornei-me apenas isso uma imagem vazia de essência no limiar da existência composta apenas de aparência.
            Talvez o começo da minha queda tenha sido a primeira vez que vi meu reflexo. Eu o vi em uma lamina de água e em um primeiro momento não me reconheci, aquela aparência não era a minha, mas eu a apreciava. Aquela projeção sorria para mim e eu correspondia sorrindo naquele momento senti vontade de me tornar aquela imagem. Hoje eu sei que aquela imagem não era apenas um mero reflexo físico de mim, mas um reflexo do que eu queria ser, ou melhor do que queriam que eu fosse.
            Fisicamente eu era um humano, mas essencialmente não. Minhas ações não eram humanas, como eu poderia aprender sobre os humanos se ao menos conseguia parecer um? Se ao menos conseguia ser aceito? Então tentei ser um humano, imitei seus atos e seus vícios. Aprendi a mentir, entreguei a soberba, a ganância, a ira, a inveja... e cada vez mais sentia-me mais próximo  da minha imagem do que da minha essência. Não percebia que eu não estava imitando o homem, mas me tornando um.
            Percebi que não bastava eu ser humano para ser aceito eu precisava fazer mais. O ponto crucial para isso foi: tornar-me a projeção que os outros homens queriam. Agora os traços de minha quase exaurida essência foram trancafiados e tentei ser o que o grupo pedia. Vesti-me de aparência, agi com atos predefinidos, disse o que queriam escutar, tornei-me o que queriam e fui aceito. O custo foi alto: minha essência hoje vaga pelo esquecimento, não sei quem sou, pois sou apenas uma projeção do que querem que eu seja. Se Narciso se confundiu com sua  imagem hoje me confundo com o outro, pois ambos somos a mesma coisa: uma máscara, uma imagem.
             Como deixei de ser um Houyhnhm, fui exilado no mundo em que me perdi. À minha antiga espécie além de relatar a  minha metamorfose disse algo que ainda não sabiam do homem. O homem na maioria das vezes escolhe seu caminho, se eu me tornei uma imagem foi porque eu quis. Talvez o que me falte seja o mesmo o que falta a vários homens: Recuperar o meu Eu e ser o que sou e não uma projeção do que querem que eu seja.

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